Aula inaugural da Cucagna – Scola de Talian destaca lançamento de nova edição de dicionários bilíngues

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Falado até hoje por milhares de descendentes de italianos espalhados pelo Brasil, o talian é resultado do contato de diferentes dialetos do norte da Itália com o português brasileiro. Há dez anos, ele se tornou a primeira língua de imigração reconhecida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) como Referência Cultural Brasileira. 

De lá para cá, a Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro) se tornou pioneira entre as instituições de ensino superior ao promover o projeto de extensão “Cucagna – Scola de Talian”. Desde 2021, a parceria entre o Centro de Línguas da Unicentro (CEL) e a Associação dos Difusores do Talian (Assodita) já emitiu mais de 1600 certificados, e recebe agora mais de 500 alunos para os cursos deste semestre.

Para marcar a nova fase da iniciativa, na última quarta-feira (14), uma aula inaugural on-line reuniu autoridades, pesquisadores, professores, alunos e falantes de talian para o lançamento da 3ª edição do “Dicionário Português Talian” e do “Dissionàrio Talian Portoghese”. Referências no estudo e difusão do idioma, as obras do escritor gaúcho Darcy Loss Luzzatto foram reeditadas recentemente pelo Iphan com a colaboração de diferentes representantes da comunidade do talian, como os professores do projeto da Unicentro, Loremi Loregian-Penkal e Juvenal Dal Castel. 

De acordo com o Iphan, foram impressos dois mil novos exemplares dos dicionários que serão entregues à comunidade linguística talian nos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, por intermédio das superintendências estaduais do instituto.

Escritos por Darcy Loss Luzzatto, Dicionário Português Talian e Dissionàrio Talian Portoghese foram reeditados pelo Iphan. (Foto: Iphan)

“É importante destacar que, acima de tudo, o talian incorporou as cores brasileiras, com uma nova prosódia, uma nova gramática, uma nova sintaxe, um léxico específico e, sobretudo, com ortografia própria, adaptada às necessidades da escrita brasileira, com o objetivo de proporcionar o ensino, mas também com a preocupação de manter o vínculo com a grafia da língua italiana para continuar a se entender com a Mãe Itália, bem como com a grafia da língua portuguesa, a Pátria-Mãe”, comenta Loremi Loregian-Penkal, coordenadora do projeto e docente do Departamento de Letras do Câmpus de Irati da Unicentro.

“O talian é fruto da diversidade que os imigrantes trouxeram. Dentro do navio, eles misturaram todos os seus saberes, os seus falares, os seus vestires. Uma grande cultura vinda de diversas regiões do norte da Itália. E aqui no Brasil, todo esse contexto encontrou um país diferente, uma cultura diferente, uma língua diferente. Então aqui se forma a língua talian, que começa a ser gestada no navio, mas que se completa aqui não só com a língua portuguesa, mas com a cultura brasileira”, complementa Juvenal Dal Castel, presidente da Assodita.

Durante a videoconferência, a diretora substituta do Departamento de Patrimônio Imaterial do Iphan, Diana Dianovsky, destacou a história da luta dos falantes de talian para o reconhecimento da língua e a importância do evento da quarta-feira integrar a programação da Semana do Patrimônio, promovida pelo órgão. “Eu acho que é um ciclo que a gente celebra aqui, desse impulso da comunidade falante do talian, de ter ele cada vez mais fortalecido, difundido, reconhecido pelo seu valor cultural. Ficamos muito felizes com ações como a da Unicentro, que promovem o ensino e a aprendizagem do talian, que fortalece a comunidade falante. Isso é o que a gente chama de ação salvaguarda”, pontua Diana.

Contribuindo diretamente com a reedição dos dicionários, o pesquisador Júlio Posenato e o presidente da Federação das Associações Ítalo-Brasileiras do Rio Grande do Sul (Fibra), Paulo Massolini, reforçaram a relevância da contribuição de Darcy Luzzatto e de outros escritores, como o Frei Rovílio da Costa, para a consolidação do idioma. 

“Os nossos detratores diziam, ‘mas cada um escreve de um jeito, isso aí é uma vergonha’. Então, conversamos com eles [com outros autores que escreviam em talian]: ‘nós precisamos ter um acordo entre nós e normatizar a forma de escrita’”, lembra Júlio Posenato, que participou da sistematização da grafia do talian nos anos 1990.

“Que essa luta continue muito forte, em especial a Cucagna – Scola de Talian, com seus maravilhosos alunos, que ela seja um estímulo para eles terem orgulho do seu passado, da sua história, daqueles que lutaram por tudo e que continuem a fazer aquilo que gloriosas pessoas já fizeram”, deseja Paulo Massolini, que encabeçou a proposta do reconhecimento do talian junto ao Ministério da Cultura ainda nos anos 2000.

Sobre o curso

A Cucagna – Scola de Talian é ofertada de maneira totalmente gratuita, sem cobrança de taxas e mensalidades. Por limitação da plataforma utilizada pelo programa, os primeiros 100 inscritos em cada nível podem acompanhar as aulas on-line ao vivo. Já os demais precisam acompanhar os módulos presencialmente. Neste semestre, 25 municípios nos estados da região sul contam com núcleos presenciais que exibem o curso e propõem atividades complementares. O projeto de extensão é financiado pelo Governo do Rio Grande do Sul, por meio da Lei de Incentivo à Cultura (Pró-Cultura) e tem o patrocínio da Cooperativa dos Produtores de Leite Serafina (Cooperlate).

Coordenador administrativo do projeto, o professor Tadinei Jacumasso enfatiza que o modelo adotado permite que as aulas cheguem a pessoas do país inteiro. “[Muitos são] alunos que nunca imaginavam ir para uma universidade, que estão em comunidades do interior do Brasil e que agora estão tendo oportunidade de estudar, de sistematizar um pouco da língua que já falavam, que seus nonos falavam. Muitas famílias usam ainda o talian no dia a dia, mas muitos têm dificuldade para escrever a língua. Então as aulas servem muito para ajudar nesse processo também de aprendizagem da escrita dessa língua”, pondera o docente.

Também presente na aula inaugural, o reitor da Unicentro, professor Fábio Hernandes, recordou que além do projeto dos cursos, o talian tem sido tema de trabalhos de mestrado e de doutorado na universidade. “Então o talian saiu da extensão, está na pesquisa, está na pós-graduação, e isso nos orgulha muito. Em nome da nossa Universidade, nós agradecemos em especial a Loremi, ao Tadinei e a todos que participam deste projeto como o Juvenal, porque eles são este projeto, que é desenvolvido somente de forma voluntária. Não há cobranças de mensalidades, não há pagamentos, há sim o empenho e a vontade de disseminar esta língua, que faz parte do nosso patrimônio”, ressalta o reitor.

Para este ano, as inscrições da Cucagna – Scola de Talian estão encerradas. Novas turmas devem começar no início de 2025. Para ser avisado sobre abertura de vagas, basta se inscrever na lista de interessados disponível no site do projeto. Na página você também encontra mais detalhes sobre a iniciativa. 

 

Por Wyllian Correa


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