Daniel Schugurensky, co-diretor da Iniciativa pela Governança Participativa na Universidade do Arizona (ASU), garante que a Suíça demonstra ao mundo que os cidadãos podem tomar decisões corretas quanto dispõem de informações e tempo para deliberar.
"Todos temos direito de participar nas decisões que nos afetam", afirma Daniel Schugurensky.
(Keystone)
O professor argentino é o coordenador do congresso "Para o povo: democracia participativa, engajamento público e educação cidadã", que ocorre em Phoenix de 3 a 5 de dezembro.
swissinfo.ch: Quem participará do congresso e como definir o objetivo central do encontro?
Daniel Schugurensky: A Universidade de Arizona receberá professores, estudantes, educadores, políticos, representantes de ONGs, funcionários, organizações comunitárias e também pessoas interessadas em reforçar a democracia através de três áreas: democracia participativa, participação cidadã e a educação dos cidadãos.
Muitas vezes pesquisadores e pessoas ativas nessas três áreas não se comunicam. O congresso quer aglutinar a teoria e a prática e, ao mesmo tempo, faze com que essa interação seja benéfica a todos.
swissinfo.ch: Como você define a democracia participativa e em que países ela é uma realidade irrefutável?
D. S.: Ela é um processo inclusivo de deliberação e tomada de decisões, que se baseia no princípio da justiça política. Todos temos o direito de participar nas decisões que nos afetam. O interesse aumenta, pois há cada vez mais pessoas que gostariam de fazer mais do que ir às urnas apenas de quatro em quatro anos.
Um dos países mais ativos é o Brasil, com suas políticas participativas. A Suíça o é através dos seus plebiscitos e a participação dos seus cantões nas decisões do país. No Canadá temos experiências interessantes de júris formados por cidadãos.
swissinfo.ch: Qual é a força do engajamento dos cidadãos nas sociedades atuais?
D. S.: Nós identificamos quatro formas de engajamentos de cidadãos. Todas são consideradas importantes. Em primeiro lugar, o engajamento cívico, que consiste, por exemplo, na participação de associações de moradores ou em projetos para melhorar as condições de vida de uma comunidade. Em segundo, a participação eleitoral, que engloba o voto e as atividades ligadas a uma campanha ou mesmo o fato de se candidatar.
O terceiro seria a voz política. Ela é a participação em movimentos sociais ou o boicote de produtos. Em quarto lugar temos a ação pública colaborativa, onde cidadãos e governos cooperam para melhorar a vida de uma comunidade.
swissinfo.ch: Em suas pesquisas você cita Eleanor Roosevelt. Ela dizia que o objetivo da educação não era somente formar cidadãos, mas sim bons cidadãos. Onde são formados? Em casa ou na escola?
D. S.: Nos dois e também fora. Muitos valores e atitudes importantes são aprendidos em casa. Por exemplo, poucas pessoas têm uma religião diferente da dos pais, o que mostra que os principais valores são transmitidos de uma geração à outra. Mas a escola também é importante.
No entanto, devemos primeiro definir como os educadores entendem a expressão "bons cidadãos". O professor canadense Joel Westheimer, que participará do congresso em Phoenix, considera que as escolas formam três tipos de bons cidadãos: o "responsável", que paga seus impostos, respeita as regras ou faz doações de caridade; o "participativo", que vota e se engaja em associações; e o "orientado à justiça social", que reúne os perfis dos dois precedentes e, além disso, questiona as causas dos problemas para formular soluções.
Muitas escolas promovem o primeiro tipo de bom cidadão. Algumas, o segundo. Mas poucas formam cidadãos orientados para a justiça social.
swissinfo.ch: Qual é o papel dos governos, nacionais ou locais, na criação de democracias participativas?
D. S.: A vontade política é indispensável para abrir espaços à participação cidadã. Esta última, juntamente com a existência de sociedades civis organizadas e engajadas, permite processos participativos que se traduzem em diálogos e intercâmbios frutíferos entre os conhecimentos técnicos, populares e políticos.
Temos alguns esforços interessantes. Na Tunísia, por exemplo, a nova constituição (2014) inclui um capítulo dedicado à democracia participativa. Na Colômbia existe uma lei de participação democrática com 111 artigos. Um dos seus promotores, o ex-senador John Sudarsky, participará do encontro em Phoenix.
Daniel Schugurenski nasceu em Buenos Aires. Ele estudou e trabalhou na Argentina, México, Canadá e Estados Unidos. Seu percurso acadêmico está voltado para a educação cidadã. Atualmente é professor na "School of Public Affairs" e a "School of Social Transformation" da Universidade do Arizona e co-diretor da iniciativa pela governança participativa na mesma universidade.
(asu/edu )
O Brasil tem órgãos municipais, estaduais e federais que promovem a participação. O pesquisador Brian Wampler explicará para nós o impacto dessas políticas participativas.
swissinfo.ch: A Suíça é um país com uma grande tradição de democracia direta. Qual é sua contribuição ao mundo?
D. S.: De fato, a Suíça é um líder mundial na democracia direta. Ela mostrou ao mundo que simples cidadãos podem tomar boas decisões se eles dispõem de informações e tempo para deliberar. Temos muito que aprender com ela.
A Suíça nos ensina também – várias pesquisas provam – que os cantões com a maior taxa de participação democrática são aqueles, onde as taxas de evasão fiscal são as menores. Isso tem a ver com a confiança. O público se sente representado pelo governo, se exprime e se engaja.
Democracia feita por todos
O congresso "Para o povo: democracia participativa, engajamento público e educação cidadã", de 3 a 5 de dezembro em Phoenix, debate os três temas que dão o nome do evento.
Trata-se de um fórum de pesquisa, projetos, estratégias metodológicas e ideais para reforçar a participação dos cidadãos na tomada de decisões.
O congresso é organizado e presidido por Daniel Schugurensky, professor na Universidade do Arizona.
Antes de Phoenix, três encontros semelhantes já ocorreram: dois na Universidade de Toronto, Canadá, (2003 e 2008), no Canadá, e na Universidade de Rosário (2010), na Argentina.
swissinfo.ch: Nessas divisões de responsabilidade, qual é o papel das mídias?
D. S.: As mídias poderiam informar mais e melhor sobre as experiências de democracia participativa que ocorrem em diferentes partes do mundo. Uma outra missão seria analisar essas experiências, identificando as áreas problemáticas e continuando a melhorá-las.
swissinfo.ch: Como a troca de experiências em Phoenix se traduz em ações?
D. S.: Os relatórios serão difundidos em um documento acessível por internet. Ao mesmo tempo iremos promover a consolidação dessas redes de cidadãos e de governos que promovem a democracia. Como nos congressos anteriores, Phoenix pode dar origem a novas iniciativas, colaborações horizontais e projetos de pesquisa.
Isso seria uma grande ajuda às pessoas interessadas em trocar experiências inovadores sobre temas precisos como orçamentos participativos, júris formados por cidadãos, processos deliberativos ou a democracia na escola. Eles poderão melhorar o trabalho que já fazem nos seus lugares de origem. Desejamos que isso inspire os que desejam expandir e aprofundar a democracia.
Adaptação: Alexander Thoele,
swissinfo.ch