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As ondas curtas, mídia a serviço da política suíça
Por Olivier Pauchard
especiais: Suíços do estrangeiro
Um livro – “A voz da Suíça no estrangeiro” – retraça a história do Serviço Suíço de Ondas Curtas (SOC), ancestral de swissinfo.ch. Nessa obra tirada de sua tese de doutorado, a historiadora Raphaëlle Ruppen Coutaz mostra como essa mídia serviu de laço afetivo entre os expatriados e pátria e a explicar a posição oficial da Suíça no estrangeiro.
O livro se interessa às atividades internacionais da SSR e particularmente à criação e aos primeiros passos do SOC, que mais tarde tornou-se Rádio Suíça Internacional (SRI), depois swissinfo.ch. O estudo aborda os anos 1932 a 1949, período crucial em que a Suíça deve ao mesmo tempo conter as propagandas estrangeiras e utilizar ela mesmo as ondas curtas para defender sua posição e promover uma imagem positiva.
swissinfo.ch: Por quais razões foi criado o SOC?
Raphaëlle Ruppen Coutaz: As ondas curtas estão em pleno desenvolvimento a partir dos anos 1930. A Suíça, através da mensagem do governo federal (Conselho Federal) do 9 de dezembro de 1938 pela defesa nacional espiritual, manifesta a vontade de construir um emissor nacional de ondas curtas. Antes, utilizava-se o da União dos Amadores de Ondas Curtas ou alugava-se o da Sociedade das Nações (estação de Prangins).
A ideia de ter uma política cultural que responda às propagandas estrangeiras, particularmente as que vinham da Itália fascista e da Alemanha nazista. Trata-se de evitar a nazificação das colônias suíças e de mostrar também a um público mais amplo que a Suíça existe, que tem sua estratégia e explicar suas decisões políticas no plano internacional.
swissinfo.ch: Le SOC era então uma mídia muito oficial…
R. R. C.: De fato, e consegui demonstrá-lo em minhas pesquisas. Esse caráter oficial não se vê unicamente no conteúdo dos programas, mais igualmente no perfil das personalidades contratadas para produzir as emissões, especialmente os cronistas. Estudando o perfil delas, vemos que pessoas muito próximas das autoridades políticas, por exemplo, porque trabalharam muito tempo como jornalistas parlamentares. Alguns foram até diretamente recomendados pelo governo federal. Encontrei cartas de recomendação como sendo “dignos de confiança”. Esses personagens se dedicam totalmente e acreditam nesse projeto de defesa nacional espiritual.
swissinfo.ch: Durante a Segunda Guerra Mundial, a Suíça era um dos raros países europeus que não participava do conflito. Essas informações eram muito ouvidas?
R. R. C.: Os boletins de informação do SOC são ouvidos sobretudo nos Estados Unidos pelo Office of War Information –Órgão da propaganda americana do Departamento de Estado – e pela Columbia Broadcasting System (CBS), que gravava os programas sob a supervisão do Cônsul Geral da Suíça em Nova Iorque, Victor Nef.
A CBS reutilizava as informações, porque em tempo de guerra, havia muito pouca informação que circulava e as raras que existem são muito parciais. Ora, a Suíça passa por propor informações relativamente neutras e um pouco mais amplas.
swissinfo.ch: Mas o SOC serve também para justificar a posição da Suíça.
R. R. C.: De fato, a partir de 1943, a Suíça compreende que os Aliados vão ganhar a guerra. Ele deve rever sua posição porque os Aliados a criticam de continuar a comercializar com as potências do Eixo. A Suíça se encontra, portanto, em uma posição em que deve justificar e explicar sua política de neutralidade.
O SOC vai realmente se engajar nessa missão, em particular junto ao público norte-americano. Ele começa a divulgar crônicas especialmente destinadas aos Estados Unidos. Elas insistem na neutralidade no sistema democrático suíço, mas também nos pontos de convergência entre os dois países. Mais original, o SOC dá a palavra aos soldados permissionários americanos, que vinham passar uma semana na Suíça. Por sorteio, alguns dos 300.000 permissionários podem falar diretamente às suas famílias nos Estados Unidos. Os americanos têm o hábito de se reunir para ouvir os programas e uma parte era retransmitida pelas rádios americanas.
Ainda existem cartas de agradecimento de parentes que dizem a que ponto são reconhecedores de poder ouvir a voz dos filhos que eles não tinham mais escutado desde que vieram lutar na Europa. Esse tipo de iniciativa permitiu construir uma imagem positiva da Suíça. É uma antecipação do que os norte-americanos denominarão nos anos 1960 a “public diplomacy”.
swissinfo.ch: Informação “neutra” no centro da Europa ocupada, difusão de programas nos Estados Unidos, esse período da guerra representa uma idade de ouro para as ondas curtas suíças?
R. R. C.: Penso que não, porque os recursos eram muito limitados, embora as atividades durante a Segunda Guerra Mundial serviram para justificar o desenvolvimento do SOC junto ao governo federal e a SSR ao final do conflito, especialmente aumentando o número e a potência das antenas de ondas curtas. A verdadeira idade de ouro virá nos anos 1950 e 1960 quando o SOC obterá financiamentos do governo federal para chegar aos países em desenvolvimento.
swissinfo.ch: O objetivo da Rádio Suíça Internacional também é de manter um laço entre os expatriados e o país de origem. Como os programas são vistos pela Quinta Suíça?
R. R. C.: É difícil saber a ressonância desses programas, porque não se podia fazer pesquisa de audiência. Mas nas cartas dos ouvintes que foram conservadas, constata-se um verdadeiro apego a essa rádio. É realmente a emoção que se exprime dessa voz longínqua, sobretudo durante a guerra, quando os correios eram interrompidos. Para os suíços de língua alemã, a utilização do dialeto acentuava ainda mais esse laço emocional.
Na época, as ligações telefônicas internacionais eram caras demais para os privados. A rádio suscitava, portanto, uma emoção que não se pode imaginar atualmente. Ouvir a voz de um parente ou a leitura da carta de um parente por um jornalista era algo totalmente diferente do que ler sozinho uma carta.
swissinfo.ch: Muitas rádios internacionais foram fechadas ou muito reduzidas. As que subsistem são dinossauros destinados a desaparecer?
R. R. C.: As evoluções técnicas colocaram em questão a legitimidade das rádios internacionais. Mas não é porque as inovações acontecem que se deve forçosamente colocar em questão certos objetivos. Isso depende do que se quer fazer.
O rádio resta a mídia que atinge mais gente, bem mais do que a internet. Por exemplo, ainda é um excelente meio para a Rádio França Internacional (RFI) de informa em larga escala na África. No caso da Suíça, a história do SOC monstra que o objetivo é atingir os suíços do estrangeiro e um auditório mais amplo constituído de uma certa elite política e econômica. Nesse sentido, parece que hoje não é mais indispensável. No entanto, a importância que teve para a opinião pública na segunda metade do século XX continua ao meu ver a justificar o mandato outorgado a essa mídia.
Adaptação: Claudinê Gonçalves
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As ondas curtas, mídia a serviço da política suíça
Olivier Pauchard
21. Março 2017 – 11:00
Um livro – “A voz da Suíça no estrangeiro” – retraça a história do Serviço Suíço de Ondas Curtas (SOC), ancestral de swissinfo.ch. Nessa obra tirada de sua tese de doutorado, a historiadora Raphaëlle Ruppen Coutaz mostra como essa mídia serviu de laço afetivo entre os expatriados e pátria e a explicar a posição oficial da Suíça no estrangeiro.
O livro se interessa às atividades internacionais da SSR e particularmente à criação e aos primeiros passos do SOC, que mais tarde tornou-se Rádio Suíça Internacional (SRI), depois swissinfo.ch. O estudo aborda os anos 1932 a 1949, período crucial em que a Suíça deve ao mesmo tempo conter as propagandas estrangeiras e utilizar ela mesmo as ondas curtas para defender sua posição e promover uma imagem positiva.
swissinfo.ch: Por quais razões foi criado o SOC?
Raphaëlle Ruppen Coutaz: As ondas curtas estão em pleno desenvolvimento a partir dos anos 1930. A Suíça, através da mensagem do governo federal (Conselho Federal) do 9 de dezembro de 1938 pela defesa nacional espiritual, manifesta a vontade de construir um emissor nacional de ondas curtas. Antes, utilizava-se o da União dos Amadores de Ondas Curtas ou alugava-se o da Sociedade das Nações (estação de Prangins).
A ideia de ter uma política cultural que responda às propagandas estrangeiras, particularmente as que vinham da Itália fascista e da Alemanha nazista. Trata-se de evitar a nazificação das colônias suíças e de mostrar também a um público mais amplo que a Suíça existe, que tem sua estratégia e explicar suas decisões políticas no plano internacional.
swissinfo.ch: Le SOC era então uma mídia muito oficial…
R. R. C.: De fato, e consegui demonstrá-lo em minhas pesquisas. Esse caráter oficial não se vê unicamente no conteúdo dos programas, mais igualmente no perfil das personalidades contratadas para produzir as emissões, especialmente os cronistas. Estudando o perfil delas, vemos que pessoas muito próximas das autoridades políticas, por exemplo, porque trabalharam muito tempo como jornalistas parlamentares. Alguns foram até diretamente recomendados pelo governo federal. Encontrei cartas de recomendação como sendo “dignos de confiança”. Esses personagens se dedicam totalmente e acreditam nesse projeto de defesa nacional espiritual.
swissinfo.ch: Durante a Segunda Guerra Mundial, a Suíça era um dos raros países europeus que não participava do conflito. Essas informações eram muito ouvidas?
R. R. C.: Os boletins de informação do SOC são ouvidos sobretudo nos Estados Unidos pelo Office of War Information –Órgão da propaganda americana do Departamento de Estado – e pela Columbia Broadcasting System (CBS), que gravava os programas sob a supervisão do Cônsul Geral da Suíça em Nova Iorque, Victor Nef.
A CBS reutilizava as informações, porque em tempo de guerra, havia muito pouca informação que circulava e as raras que existem são muito parciais. Ora, a Suíça passa por propor informações relativamente neutras e um pouco mais amplas.
swissinfo.ch: Mas o SOC serve também para justificar a posição da Suíça.
R. R. C.: De fato, a partir de 1943, a Suíça compreende que os Aliados vão ganhar a guerra. Ele deve rever sua posição porque os Aliados a criticam de continuar a comercializar com as potências do Eixo. A Suíça se encontra, portanto, em uma posição em que deve justificar e explicar sua política de neutralidade.
O SOC vai realmente se engajar nessa missão, em particular junto ao público norte-americano. Ele começa a divulgar crônicas especialmente destinadas aos Estados Unidos. Elas insistem na neutralidade no sistema democrático suíço, mas também nos pontos de convergência entre os dois países. Mais original, o SOC dá a palavra aos soldados permissionários americanos, que vinham passar uma semana na Suíça. Por sorteio, alguns dos 300.000 permissionários podem falar diretamente às suas famílias nos Estados Unidos. Os americanos têm o hábito de se reunir para ouvir os programas e uma parte era retransmitida pelas rádios americanas.
Ainda existem cartas de agradecimento de parentes que dizem a que ponto são reconhecedores de poder ouvir a voz dos filhos que eles não tinham mais escutado desde que vieram lutar na Europa. Esse tipo de iniciativa permitiu construir uma imagem positiva da Suíça. É uma antecipação do que os norte-americanos denominarão nos anos 1960 a “public diplomacy”.
swissinfo.ch: Informação “neutra” no centro da Europa ocupada, difusão de programas nos Estados Unidos, esse período da guerra representa uma idade de ouro para as ondas curtas suíças?
R. R. C.: Penso que não, porque os recursos eram muito limitados, embora as atividades durante a Segunda Guerra Mundial serviram para justificar o desenvolvimento do SOC junto ao governo federal e a SSR ao final do conflito, especialmente aumentando o número e a potência das antenas de ondas curtas. A verdadeira idade de ouro virá nos anos 1950 e 1960 quando o SOC obterá financiamentos do governo federal para chegar aos países em desenvolvimento.
swissinfo.ch: O objetivo da Rádio Suíça Internacional também é de manter um laço entre os expatriados e o país de origem. Como os programas são vistos pela Quinta Suíça?
R. R. C.: É difícil saber a ressonância desses programas, porque não se podia fazer pesquisa de audiência. Mas nas cartas dos ouvintes que foram conservadas, constata-se um verdadeiro apego a essa rádio. É realmente a emoção que se exprime dessa voz longínqua, sobretudo durante a guerra, quando os correios eram interrompidos. Para os suíços de língua alemã, a utilização do dialeto acentuava ainda mais esse laço emocional.
Na época, as ligações telefônicas internacionais eram caras demais para os privados. A rádio suscitava, portanto, uma emoção que não se pode imaginar atualmente. Ouvir a voz de um parente ou a leitura da carta de um parente por um jornalista era algo totalmente diferente do que ler sozinho uma carta.
swissinfo.ch: Muitas rádios internacionais foram fechadas ou muito reduzidas. As que subsistem são dinossauros destinados a desaparecer?
R. R. C.: As evoluções técnicas colocaram em questão a legitimidade das rádios internacionais. Mas não é porque as inovações acontecem que se deve forçosamente colocar em questão certos objetivos. Isso depende do que se quer fazer.
O rádio resta a mídia que atinge mais gente, bem mais do que a internet. Por exemplo, ainda é um excelente meio para a Rádio França Internacional (RFI) de informa em larga escala na África. No caso da Suíça, a história do SOC monstra que o objetivo é atingir os suíços do estrangeiro e um auditório mais amplo constituído de uma certa elite política e econômica. Nesse sentido, parece que hoje não é mais indispensável. No entanto, a importância que teve para a opinião pública na segunda metade do século XX continua ao meu ver a justificar o mandato outorgado a essa mídia.
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Fonte: Swiss Info