Tremendão na Ativa: Erasmo Carlos inicia novo ciclo musical e retorna ao cinema
“Esta moçada de hoje representa novas escolas. Na verdade, sou eu quem aprende com eles”, diz o cantor sobre os colaboradores do recém-lançado álbum Amor É Isto
por Paulo Cavalcanti
São poucos os artistas do pop rock nacional surgidos no período pré-tropicalista que ainda têm moral com o público e com a crítica e também conseguem atiçar a imaginação das novas gerações. Erasmo Carlos é um desses raros exemplos. O Tremendão, que completa 77 anos no dia 5 de junho, ressurge com um disco de canções inéditas e retorna ao cinema, após décadas longe da tela grande. Estas são apenas algumas das atividades que irão ocupá-lo em 2018. O artista volta à cena após ter passado por complicações cardíacas. Erasmo não perde o bom humor e ainda tira uma com a sua saúde: “Bom, agora estou usando marca-passo. Posso dizer que me tornei um cantor tecno!”
O novo trabalho de Erasmo se chama Amor É Isto e saiu este mês pela gravadora Som Livre. Por muitos anos Erasmo lançou seus álbuns pelo selo Coqueiro Verde, de propriedade da família dele. O novo lar fonográfico o deixou animado. “Sim, é algo diferente, um novo ambiente, isso movimenta a vida”, exulta. Amor É Isto é o primeiro fruto de uma nova fase, que vem após a trilogia que teve Rock ‘n’ Roll (2009), Sexo (2011) e Gigante Gentil (2014). Erasmo explica que este é um disco mais orgânico, que remete ao que ele produziu no início da década de 1970. E que é basicamente um trabalho de canções avulsas, sem nenhum conceito amarrando-as.
Ele conta que o ponto de partida para o disco foi um livro de poemas que ele está preparando para o segundo semestre, 111 Poesias. “Eu comecei a juntar todo este material e vi que tinha muita coisa legal lá”, fala. “Então, pedi ajuda. Fui mandando estas letras para o Samuel [Rosa], para a Marisa [Monte] e para o Arnaldo [Antunes]. O Marcelo Camelo e o Nando Reis também me mandaram algumas melodias e isso foi me motivando a fazer novas canções.”
A produção de Amor É Isto ficou a cargo de Pupillo, baterista da Nação Zumbi. “Por muitos anos a Marisa Monte falava que eu deveria trabalhar com ele, que o Pupillo tinha um talento enorme. Verdade, ele se saiu muito bem.” Erasmo comenta humildemente que os jovens dizem que aprendem com ele, mas argumenta que é justamente o contrário. “Esta moçada de hoje representa novas escolas. Na verdade, sou eu quem aprende com eles. Essa é a graça.”
Um destes novatos que agora entram no quadrante de Erasmo é o rapper Emicida. Ele e Erasmo estão juntos em “Termos e Condições”. Mas o Tremendão não entra no hip-hop – não desta vez. A faixa, na verdade, é uma balada soul melancólica que poderia ter sido escrita por Cassiano, Hyldon ou qualquer mestre da década de 1970. Erasmo não esconde que é fã do MC da zona norte paulista: “Eu tenho uma visão geral sobre o mundo e ele compartilha essas mesmas ideias”, diz o cantor. “O Emicida não narra apenas o que acontece na periferia. O discurso dele abrange muitas coisas, temas universais.” O Tremendão adianta que a parceria gerou mais uma faixa, chamada “Abre Alas de Verão”, que estará no próximo disco de inéditas de Gal Costa.
O cantor e compositor está ciente do enorme culto acerca dos álbuns que lançou no começo dos anos 1970. Foi o período em que ele já havia deixado a inocência da Jovem Guarda para trás e embarcou em uma jornada musical mais madura, tanto nas melodias quanto nas letras e na produção. Discos como Carlos, Erasmo, Sonhos e Memórias e Projeto Salva Terra são muito valorizados e as edições em vinil trocam de mãos por uma boa soma. “Eu gosto muito daqueles antigos LPs”, comenta. “Só não sabia, ou melhor, não poderia imaginar que, com o tempo, eles teriam tanta influência sobre o trabalho de outras pessoas. Me preocupo em fazer algo bom sempre. Quem sabe o que eu gravo hoje também seja considerado de qualidade e valor daqui a 30 anos. Só o tempo vai falar se é realmente bom.”
Neste ano a estrela de Erasmo Carlos também brilhará na tela grande. Em 1972, ele foi um dos astros do drama Os Machões, dirigido por Reginaldo Farias. A atuação dele foi altamente elogiada e diversos críticos da época sugeriram que ele deveria continuar a atuar com regularidade, mas isso não aconteceu. No fim deste mês, porém, Erasmo retorna ao cinema com Paraíso Perdido, dirigido por Monique Gardenberg. No elenco estão Seu Jorge, Hermila Guedes, Marjorie Estiano e Jaloo, entre outros.
No longa, Erasmo é José, o patriarca de uma família pouco convencional. O universo do longa gira em torno de uma boate decadente cuja maior atração é a execução da chamada música brega. O artista detalha o processo: “A Monique pediu que eu assistisse ao filme O Leopardo (1963), estrelado pelo Burt Lancaster, para que eu entrasse na atmosfera dramática que ela queria”. As filmagens ocorreram em São Paulo. Eu vinha para a cidade e exercia minha disciplina para entrar na pele daquele personagem. Usei uma peruca e me entreguei ao trabalho.” Para o cantor, interagir com um elenco de jovens atores foi incrível: “Também aprendi muito com eles a cada dia de trabalho”, fala.
No segundo semestre, a estrela do cantor brilhará novamente na tela grande, mas de uma outra maneira. Finalmente irá estrear Minha Fama de Mau, a biografia cinematográfica baseada no livro homônimo que ele lançou em 2009. O longa, que se encontra em pós-produção, irá contar a trajetória dele desde os tempos em que era um jovem roqueiro no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, chegando até a consagração na Jovem Guarda. Erasmo será vivido pelo ator e cantor Chay Suede. O Tremendão está contando os minutos para ver o resultado. “Só sei que já terminaram as filmagens, mas eu não vi nada ainda. Eu apenas escrevi o livro. O resto ficou por conta do diretor, o Lui Farias, e da turma que se encarregou do roteiro.” Mas, se Erasmo não se envolveu com o acabamento dramático, ele deu alguns pitacos em relação à parte musical: “A trilha sonora está muito boa”, diz. “O Chay e o Gabriel (Leone), que vive o Roberto Carlos, cantaram tudo direitinho”.