Festival Rider #DáPraFazer 2018: indie, rap, funk e eletrônico foram a trilha da celebração da cultura urbana independente

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Festival Rider #DáPraFazer 2018: indie, rap, funk e eletrônico foram a trilha da celebração da cultura urbana independente


Emicida, Teto Preto, Terno Rei, Raça, Yas Werneck, Dory de Oliveira, Áurea Semiséria movimentaram mais de 4 mil pessoas no evento

por Igor Brunaldi, do Rio de Janeiro
19 de Março de 2018 às 14:09

Aconteceu no último sábado, 17, o festival #DáPraFazer, organizado pela Rider e cocriado pelo coletivo feminino Noix. Realizado no Largo Alexandre Herculano, no centro do Rio de Janeiro, o evento pode ser melhor descrito, em poucas palavras, como uma ode à produçao cultural urbana. A arte se mostrava presente em todos os cantos do ambiente: containers posicionados lado a lado formavam o street market, área onde mais de 40 marcas independentes nacionais de roupa exibiam e vendiam suas peças; ao mesmo tempo, era possível ouvir a música que vinha do palco R1, e ainda assistir pessoalmente ao artista norte-americano Ahol, convidado do evento, grafitando um muro.

Veja a nossa cobertura do festival Rider #DáPraFazer 2017

Seja na parede, no street market ou nos looks de quem foi curtir o evento gratuito, a moda e a criatividade inundavam o local e pulsavam acompanhando os diversos ritmos que vinham dos amplificadores. Músicos de várias regiões do país se juntaram para fazer a trilha sonora eclética das quase 12 horas de festival. O selo Balaclava enviou as bandas paulistanas Raça e Terno Rei, que agitaram o público com riffs, solos de guitarra e sintetizadores extraídos de um sonho ou delírio quase que febril (o calor carioca fez jus à fama que tem). Representando o rap, Emicida subiu ao palco com mais três MCs convidadas por ele mesmo: a carioca Yas Werneck (que além de rapper também é professor de matemática), a paulista Dory de Oliveira e a soteropolitana Áurea Semiséria, e que, segundo Emicida ”são nomes que fazem justiça às regiões de onde vêm’’. O coletivo carioca Heavy Baile levou os baianos do ATTØØXXÁ, apresentando uma mistura sonora atípica e difícil de classificar, mas que poderia ser chamada de axé-funk-psicodélico. O techno foi o gênero escolhido para encerrar o festival, e contou com a apresentação frenética, catártica (e muitos outros sinônimos) do grupo Teto Preto, além de livesets da chilena Valesuchi e do selo carioca Domina.

A atmosfera, ao mesmo tempo que descontraída e cheia de vida, carregava um certo peso de luto, resultado da execução da vereadora Marielle Franco, três dias antes do evento. Como sempre foi característico aos artistas, o ocorrido não passou despercebido. O entretenimento pode, no geral, ser abordado por duas vertentes: de um lado, pode servir como válvula de escape, proporcionando momentos de desligamento de um caos instaurado na sociedade. Do outro lado, pode servir como alto falante e ferramenta para a luta, e foi nesse lado que os artistas do rap se posicionaram na apresentação. Emicida, que cantou com a foto da vereadora sendo exibida no telão, disse, em entrevista exclusiva à Rolling Stone, que ”o rap sempre se posicionou a favor da preservação da vida de quem nasce nas favelas, a favor dos direitos humanos, e é necessário e importante politizar a morte de um ícone como ela, como uma forma de não permitir que a bandeira dela morra também.” Com uma clara tristeza na voz, ele conclui afirmando que ”é impossível não dizer que a cor da pele e a criação dela foram motivos para que isso fosse feito. A gente precisa cuidar de nóis. A gente precisa ficar junto. As evidências provam: 2018 vai ser um ano de guerra. Guerra de informação. Guerra ideológica. Discussões intermináveis. E agora tivemos uma comprovação empírica de que vai ser uma guerra sangrenta.”

As três Mcs que se apresentaram com o rapper, todas elas militantes do rap feminino, propagaram suas vozes para os mais de 4 mil espectadores que compareceram durante o dia. Letras fortes, impactantes, que formam uma colagem de esperança, determinação e indignação eram lançadas ao público. Com vozes firmes Yas Werneck, Dory de Oliveira e Áurea Semiséria conversaram com a Rolling Stone sobre machismo e a força das mulheres no hip-hop. ”Tenho 15 anos de rap nacional e ainda não alcancei o lugar que eu queria estar. O que precisa pra gente se tornar uma Emicida, uma MV Bill, uma Mano Brown? São poucas as minas que tem essa visibilidade, e tem muita mina no rap, mas ainda falta muita oportunidade, falta aparecer mais as minas independentes nesses festivais grandiosos. São sempre as mesmas figurinhas carimbadas”, conta Dory, e Yas acrescenta: ”o nosso diferencial é que a gente é independente. Não temos uma gravadora por trás, não temos apoio que nao seja de nós mesmas, do nosso pulso, dos nossos amigos, de gente que acredita no nosso trabalho”. Áurea, a mais nova das três, aproveita um instante de silêncio entre uma resposta e outra para adicionar: ”Nós, mulheres no hip-hop, somos bastante independentes. Alguns homens dizem que apoiam, mas é só da boca pra fora, na hora da ação não fazem nada, é só pra ter visibilidade em cima da gente. A nossa luta é foda, eu digo isso todos os dias, mas eu não paro.” Quando mencionado o caso de Marielle, Yas não demora para se posicionar, contando que ”eu fico pensando quando vai ser o momento que eu vou cutucar o vespeiro e vai sobrar para mim. Ela foi silenciada. Quem incomoda demais é silenciada”. Logo em seguida a voz de Dory aparece para dizer que sentiu a morte da vereadora e sente a morte de todas as mulheres negras, declarando que ”tudo que eu escrevo tem a ver com isso. A gente vive na luta, no luto e na corda bamba”. Após alguns segundos, foi novamente a vez de Áurea responder, sem pressa de elaborar o impacto que é transmitido através das palavras. ”Já tomei murro e chute de macho na rua por estar lutando pelos nossos direitos. A partir do momento que você se move, causa incômodo e aí muita gente vem de encontro. Nossa luta vai continuar, e pra eles vai piorar muito. A gente não está de brincadeira.”

O festival lotou, respirou e transpirou estilo, diversidade, e o mais importante, liberdade de expressão através de várias formas de arte, mostrando que o cenário artístico independente vive e ferve.



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