Livro explica porque reacionários dominam internet na França

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Livro explica porque reacionários dominam internet na França

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Taíssa Stivanin

mediaImagens da Marine Le Pen com seus gatos fazem parte da estratégia de marketing para suavizar a imagem da líder.
Marine Le Pen divulgação

Como explicar o termo francês fachosphère? Facho, em francês, significa facista. A palavra, que surgiu há alguns anos, designa a atividade da extrema-direita na internet francesa e virou tema do livro dos jornalistas David Doucet e Dominique Albertini, "A 'fachosphère', como a extrema-direita vence a batalha na internet."

Durante dois anos, os autores mergulharam no mundo dos católicos ultratradicionais, dos cybermilitantes do partido Frente Nacional, blogueiros e movimentos reacionários e neonazistas. Editor-chefe da revista francesa “Les Inrockptibles”, David Doucet começou a se interessar pelo assunto quando ainda era estudante.

Durante meses, ele produziu uma reportagem investigativa sobre um dos principais sites da Fachosphère francesa, o “F de Souche”. O nome do blog é uma referência ao termo “français de souche”, comumente usado pelos ultraconservadores para identificar os franceses “puros”, que não descendem de imigrantes. Doucet obteve depois de muita negociação uma entrevista com o autor do blog, o que o incitou a continuar sua investigação. Paralelamente, ele também lançou um livro sobre a história da extrema-direita francesa, o que o levou a aprofundar sua pesquisa e lançar uma terceira obra sobre o assunto.

“O que tentamos foi mostrar como um grupo de indivíduos, atrás de uma tela de computador, consegue influenciar o debate político e midiático na França”, conta Doucet. Ele cita o exemplo da cerimônia oficial em comemoração da batalha de Verdun, em maio deste ano. Um dos artistas convidados, o rapper Black M, teve sua participação cancelada por pressão da extrema-direita. Membros do partido Frente Nacional alegaram que uma de suas letras ofendia o país, usando termos empregados pelo grupo Estado Islâmico.

Manifestantes nas ruas de Paris contra o casamento gay e também contra "barrigas de aluguel" e procriação assistida.
REUTERS/Benoit Tessier

O motivo oficial do cancelamento, entretanto, foi o “risco de tumultos”. “Isso mostra que os sites reacionários, mesmo à margem da sociedade, têm uma influência no real”, observa o jornalista francês. Ele também cita o exemplo da “Manif Pour Tous”, movimento contra a legalização do casamento homossexual. “A organização de muitos encontros foi feita em sites católicos tradicionais de extrema-direita”, explica. “Eles têm um verdadeiro poder de mobilização.”

Controle da Internet

Como as ideias racistas e discriminatórias se difundem pela internet sem controle na França? As redes sociais, como Facebook ou Twitter, pertencem a multinacionais e estão hospedadas em outros países, assim como alguns sites reacionários. “As instituições francesas ficam com as mãos amarradas. É preciso que a Justiça do país entre em contato com o país onde o site está difundindo o conteúdo, o que é lento”.

La fachosphère, Albertini, Daniel Doucet
http://editions.flammarion.com

Muitos países também não têm as mesmas noções de liberdade pública, explica Doucet, e as instituições têm dificuldade em reagir à rapidez e à instantaneidade da Internet “Facebook e Twitter, por exemplo, são bastante permissivos, um reflexo da própria cultura americana. Pode-se dizer tudo, existem menos regras. A França tenta se organizar em termos judiciais, mas os blogueiros conseguem escapar a esse monitoramento deslocando a hospedagem do site para outros países, o que complica o trabalho.”

Contraproposta

Segundo Doucet, o problema é que não há uma estratégia digital à altura da atividade reacionária na rede. “Não há uma contra proposição. Hoje as instituições públicas não têm uma presença forte no YouTube, por exemplo. É muito fácil acessar conteúdos extremistas sem perceber. Nas escolas também é preciso ensinar os alunos a diferenciar a informação confiável de uma simples opinião postada por um simpatizante da extrema-direita, que ganha a mesma importância de uma declaração publicada por um acadêmico”, declara.
A resposta a esse discurso reacionário, para atingir a juventude francesa, deve vir e se difundir da Internet. “Precisamos adaptar nossa mensagem à juventude em novos meios”, resume.

Escalada da extrema-direita

Segundo ele, a atividade dos “fachos” na internet não explica o aumento da influência da extrema-direita no país. “É um sintoma, um reflexo da vida real. Hoje as pessoas não têm vergonha de expressar opiniões reacionárias nas ruas. A Internet reflete isso”, diz. E como explicar essa reviravolta no pensamento coletivo francês? “Por uma sucessão de governos que se sucederam e decepcionaram os franceses porque não foram capazes de instaurar a política que eles haviam prometido. E há também uma dificuldade em dissociar a direita da esquerda na França, com políticas similares. A Frente Nacional acaba dando a impressão de ter uma política coerente, de soberania social e econômica, o que, novamente, cria a impressão de uma homogeneidade”, diz. “A esquerda promove avanços sociais mais ao mesmo tempo com um programa econômico liberal”.

Terrorismo contribui para avanço de movimentos reacionários

A onda de atentados terroristas, explica Doucet, também contribuiu para o avanço da extrema-direita no país. Segundo ele, em 2012, data das últimas eleições presidenciais na França, a presidente da Frente Nacional, Marine Le Pen, concentrava seu discurso, sem sucesso, em temas sociais e econômicos. Depois do ataque de Mohammed Merah em Toulouse, contra uma escola judaica, a candidata Frente Nacional, diz ele, mudou de tática: passou a falar da “islamização” da França, de identidade e da ameaça extremista. A estratégia rendeu frutos e, desde então, a candidata não para de crescer nas pesquisas.

Fonte: Rádio França Internacional

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